Programação especial marcou o mês dedicado à Consciência Negra
No mês dedicado à Consciência Negra, a Obsma/Fiocruz promoveu, nos dias 22 e 23 de novembro, uma programação especial durante a 9ª Oficina Pedagógica Online. Com o tema “Aprender para ensinar: questões raciais no Brasil”, o evento incentivou o debate sobre racismo estrutual, oferecendo aos professores de todo o país discussões valiosas com o objetivo de ampliar a educação antirracista nas escolas.
A oficina contou com a participação de professores e intelectuais negros muito especiais. Assistente Social voluntária no Projeto Mães da Favela, realizado pela Central Única das Favelas (CUFA) na Bahia, e pós graduanda em Saúde Pública pela Faculdade de Ciências da Bahia, Verena Eliotério apresentou seu trabalho de atendimento, escuta e acolhimento de mulheres negras e em situação de vulnerabilidade na cidade de Salvador.
Verena destacou a importância da discussão diária e do combate ao racismo em todos os meses do ano. Segundo ela, é necessário fortalecer uma visão decolonial – que combata e questione o genocídio negro e indígena, os pressupostos coloniais de imposição da cultura ocidental, a classificação de raças e os ideais de normatividade – além do diálogo interseccional entre raça, gênero, classe e sexualidade, ligados diretamente a sistemas de opressão, dominação e discriminação.
A pesquisadora incentivou a leitura de autores e autoras negras no ambiente escolar. Grada Kilomba, Djamila Ribeiro Ângela Davis, Silvio Almeida, Carla Akotirene, Neusa Santos Souza e Conceição Evaristo foram alguns dos intelectuais negros citados por Verena.
– Não basta não ser racista, é preciso ser antirracista. Resistir às dores é um movimento ancestral que ainda nos dói, sangra e mata. É só olhar como somos: maioria ocupando índices gritantes de feminicídio, no topo das taxas de analfabetismo, desemprego e óbitos por COVID 19, disse.
O debate foi seguido pela apresentação de Ricardo Benedicto, filósofo, doutor em Educação e professor do Instituto de Humanidades e Letras da Unilab.
Com o tema “Educação Antirracista”, Ricardo trouxe, entre outros nomes, o escritor, artista e ativista Adbias do Nascimento para denunciar as tentativas políticas de embranquecimento, epistemicídio e eugenia na educação, literatura e ciência.
– Precisamos de um currículo voltado para aquilombamento. Toda ciência, o desenvolvimento da filosofia e da matemática, por exemplo, surgiu em África, no Egito. É necessário rever todo o processo da nossa história. Os africanos chegaram muito antes de Colombo e desenvolveram civilizações aqui, afirmou, lembrando também da Lei 10.639, que só em 2003 regulamentou a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas.
No segundo dia de oficina, a psicóloga e doutora em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da UERJ, Dandara Ramos, evidenciou o impacto dapandemia e dos determinantes sociais no adoecimento da população negra, que sofre ainda mais com as principais doenças negligenciadas e a falta de acesso à saúde. A pesquisadora da área de Saúde Materno-Infantil apresentou dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (IBGE 2015) e defendeu a escola enquanto espaço sociopolítico e de promoção à saúde integral.
– Até 1 ano de vida, crianças negras terão 22,5% a mais de chance de morrer em comparação a crianças brancas, a maior parte por causas evitáveis como pneumonias. A disparidade da expectativa de vida e da taxa de homicídio dessa população é até quatro vezes maior, sobretudo para os jovens. A formação cidadã é muito importante para atingirmos a justiça social, enfatizou.
O geógrafo e professor da Universidade Federal da Bahia, Diosmar Marcelino, apresentou dados acerca do tema “Racismo Ambiental”, mostrando como práticas racistas contribuem para o aumento da vulnerabilidade diante dos impactos das mudanças climáticas e outras crises globais. Diosmar debateu epistemologias de territórios quilombolas, a violação de direitos dos povos originários na Amazônia e a necessidade de produzir uma ciência que olhe para estes territórios.
– O Brasil nunca esteve atento à população negra, que sempre produziu conhecimento para o país. O licenciamento ambiental no Brasil não é feito para cuidar da população, sobretudo a negra. O racismo ambiental surge do racismo institucional e isso precisa estar em discussão, ressaltou.
Diosmar é pesquisador da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), onde coordenada o projeto Mudanças Climáticas em face do Reconhecimento dos Territórios Negros. Doutorando em Geografia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), ele também é autor do livro A geopolítica do estado e o território quilombola no século XXI, lançado pela Paco Editorial, em 2018. A publicação revela como o Estado mantém o racismo como determinante para um território desigual. A pesquisa tem no espaço geográfico a base teórica de análise dos Territórios Quilombolas na Bahia e busca combater as leituras hegemônicas sobre a formação do território brasileiro.
A 9ª Oficina Pedagógica Online foi organizada pela Regional Nordeste II da Olimpíada da Fiocruz, atualmente sediada em Salvador, sob a coordenação de Marilda Gonçalves, pesquisadora titular do Instituto Gonçalo Moniz (IGM) da FIOCRUZ-BA, e Antônio Marcos Brotas, jornalista e doutor em cultura e sociedade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Dar voz à diversidade racial é falar de saúde integral. Só com inclusão, visibilidade e igualdade de direitos podemos pensar em um país mais justo.
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